CRM-DF e Judiciário têm ressalvas sobre a Resolução n° 487/2023, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que pretende fechar os Hospitais de Custódia do país

A política antimanicomial do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tem sido alvo de críticas e questionamentos por parte do Conselho Federal e Regionais de medicina de todo do Brasil e das associações de psiquiatria, grupos políticos, juristas, federações médicas, entre outros grupos. Na avaliação das entidades, a decisão de fechar os Hospitais de Custódia e substituí-los por atendimentos ambulatoriais pode trazer consequências negativas e riscos com grandes impactos sociais para os pacientes e a sociedade.

Em fevereiro de 2023, o CNJ publicou a Resolução n° 487/2023, que institui a Política Antimanicomial do Poder Judiciário e estabelece procedimentos e diretrizes para implementar a Lei n° 10.216/2001, que dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. A normativa, que será adotada pelo Poder Judiciário, causa preocupação, diante da determinação de encerramento dos Hospitais de Custódia e Tratamento Psiquiátrico existentes no país. Consta na resolução, que os pacientes internados não ficarão mais isolados e serão direcionados aos Hospitais Gerais ou aos Centros de Saúde sem características asilares, sendo priorizado o atendimento ambulatorial, sem internação.

A decisão foi alvo de debate no Conselho Regional de Medicina do Distrito Federal (CRM-DF) que manifestou preocupação em relação a política adotada e realizou uma reunião na última quarta-feira (10/05), para tratar da resolução do CNJ, que será adotada pelo Poder Judiciário ainda este mês. Médicos e representantes do Judiciário participaram do encontro que ocorreu no plenário da sede do CRM-DF.

Para a presidente do Conselho Marcela Montandon, a resolução causa muitos impactos, dentre eles, a falta de assistência médica ao doente que ficará sem tratamento adequado, o que pode agravar o quadro clínico do paciente, além da falta de profissional com expertise em conduzir o tratamento nos Centro de Atenção Psíquico Social (CAPs). “O local não está preparado para receber essas pessoas, nem possuí estrutura para realizar esse tipo de atendimento. O CRM-DF vê com muita preocupação a decisão dessa resolução, por isso temos debatido, amplamente, com médicos e autoridades do judiciário. Queremos o melhor para a saúde dessas pessoas e que elas recebam um atendimento digno e adequado”, explicou a presidente do CRM-DF.

A psiquiatra e membro da Câmera Técnica de psiquiatria do CRM-DF, Maria Dilma Teodoro, também foi contundente ao debater que os CAPs não possuem equipe qualificada para atender esse tipo de paciente. “É inviável colocar um paciente psicótico, grave, na enfermaria de clínica médica, sem ter uma equipe devidamente qualificada para cuidar dessa pessoa. Com isso deixaremos de cumprir a Lei 10.216/2001, que diz que temos que garantir o tratamento para aqueles que sofrem de doença mental”, ressaltou.

O conselheiro do Conselho Federal de Medicina e membro da Câmara Técnica de Psiquiatria do CFM, Salomão Rodrigues, ressaltou que a resolução foi editada sem consulta às entidades médicas e dessa forma, poderá colocar toda a população em risco, uma vez que pessoas com transtornos mentais e cometeram crimes serão libertadas.  “O que me assusta é que pessoas que estão no alto nível da Justiça brasileira decidem legislar sobre algo que eles não conhecem e não ouviram especialistas. Estão entrando em um campo minado sem saber disso”, comentou Salomão.

Antônio Geraldo, presidente da Associação Brasileira de Psiquiatria, apresentou o cenário da luta pela saúde mental no mundo. “Há um descaso muito grande com esses pacientes. As políticas públicas de saúde mental em qualquer país do mundo não recebem investimento financeiro”, manifestou.

Já Gutemberg Fialho, presidente do Sindmédico-DF, avaliou que as unidades de saúde da capital federal não têm condições de receber os pacientes que venham a ser desinternados. “É necessário que essa resolução seja revista. Não tem estrutura física com as contenções que um hospital psiquiátrico tem para conter um paciente que por acaso venha a ter um surto”, disse.

Judiciário

Fernando Melo, juiz auxiliar da corregedoria do Tribunal de Justiça do DF e Territórios (TJDFT), participou da reunião como um dos representantes do Poder Judiciário local.  Achou pertinente a argumentação do CRM-DF, mas ressaltou que o TJDFT terá que executá-la. “Sabemos que não existem leitos para abrigar todos os internados, mas o Tribunal deverá respeitar a resolução que é nacional. Se o intuito da resolução é resguardar os direitos humanos, será que não será vítima de revitimização?”, pontuou Fernando.

Leila Cury, juíza titular da Vara de Execuções Penais do TJDFT, também esteve na reunião. Segundo a magistrada, atualmente, no Distrito Federal há 158 pessoas internadas em hospitais de custódia. A magistrada informou a maioria dos pacientes de hospitais de custódia é abandonada pela família. “Isso é ruim porque dificulta a desinternação”, disse. Cury informou que há dificuldade durante o tratamento ambulatorial dos pacientes, principalmente nas saídas terapêuticas. “As pessoas passam poucos dias em tratamento. Muitas vezes, a família só as recebem porque sabem que vão voltar para a internação”, relatou.

Críticas ao posicionamento do CNJ

Segurança e proteção: Uma das principais críticas à política antimanicomial é relacionada à segurança e proteção dos pacientes e da sociedade como um todo. A desinstitucionalização pode levar à falta de acompanhamento adequado, aumentando o risco de violência e negligência em relação aos indivíduos com transtornos mentais graves.

Falta de recursos e infraestrutura: A implementação da política antimanicomial requer investimentos significativos em recursos e infraestrutura para fortalecer a rede de atenção psicossocial. No entanto, a estrutura ainda é insuficiente em muitas regiões do país, resultando em um atendimento precário e na falta de suporte adequado às pessoas com transtornos mentais.

Desafios para pacientes mais graves:  A desospitalização completa pode não ser a melhor opção para esses indivíduos, pois eles precisam de cuidados intensivos e especializados que podem não estar disponíveis nos CAPs.

Inclusão social efetiva: Preocupações com relação à efetividade da inclusão social proposta pela política antimanicomial. A comunidade pode não estar pronta para acolher e integrar plenamente as pessoas com transtornos mentais, especialmente considerando o estigma e o preconceito ainda presentes na sociedade.

Desafios da política antimanicomial: Além das críticas, há desafios práticos associados à implementação da política antimanicomial. Dentre eles, destacam-se a necessidade de investimentos na formação de profissionais de saúde mental, o estabelecimento de políticas de reinserção social eficazes e a criação de espaços de acolhimento e cuidado comunitários bem estruturados.

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Clique aqui e assista a reunião gravada.

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